Ainda sobre o Bem-aventurado Justo Takayama Ukon

Pax et bonum!

Após a postagem da tradução de um texto sobre o Bem-aventurado Justo Takayama Ukon, tirado do site da Conferência dos Bispos Católicos do Japão, gostaria apenas de repassar mais dados históricos de sua biografia e algumas informações sobre a beatificação, bem como compartilhar o vídeo inteiro da Missa.

Retrato oficial do Bem-aventurado Justo Takayama Ukon feito para a Beatificação
Um pouco de história

Takayama Ukon (高山右近, sendo Takayama o sobrenome), nasceu em 1552, em data razoavelmente próxima à morte de São Francisco Xavier (+03/12/1552), em Takayama, Settsu (atualmente distrito de Toyono), Osaka, Japão. Ainda quando criança, em 1558, sua família mudou-se para Haibara, Nara.
Monumento no local aproximado do nascimento de Takayama Ukon, em Toyono
Quando criança era chamado de Higokorô (彦五郎), sendo este, portanto, seu nome de nascimento. Chegando à "idade adulta", passou a ser chamado de Shigetomo (重友). Há ainda outros nomes. "Ukon" é parte de um título honorífico que recebeu posteriormente. Todavia, é o nome pelo qual é mais conhecido.
Seu pai chamava-se Tomoteru (e também era chamado de Zusho), servia a Matsunaga Hisahide e era senhor do castelo de Sawa. A região era a antiga província de Yamato. O castelo pode, então, ser também citado sob o nome de Yamatozawa.
Monumento em honra de Takayama Ukon na região das ruínas do castelo de Sawa
Tomoteru, fervoroso budista, conheceu o cristianismo, converteu-se e foi batizado após perder um debate doutrinal em 1564 (com um Ir. Lourenço, discípulo de São Francisco Xavier), tomando o nome de Dario. Higokorô foi batizado e recebeu o nome de Justo.
Após o envolvimento de Hisahide na situação que pressionou o suicídio do shogun (algo como um líder militar supremo que, de certa forma, governava o país) Ashikaga Yoshiteru, o castelo de Sawa foi perdido e a família Takayama teve que fugir, abrigando-se, porteriormente, em Takatsuki, sob a bandeira de Oda Nobunaga, através de Wada Koremasa, um conhecido da família. Isto ocorreu em 1568.
Em 1571 a família Wada desentendeu-se com Araki Murashige, vassalo de Ikeda Katsumasa, que servia a inimigos de Oda Nobunaga. Murashige cercou o castelo de Takatsuki e Koremasa foi morto no confronto. Sem poder subjugar os Takayama, Murashige permitiu-lhes servir ao sucessor de Koremasa, Korenaga. Este, porém, pretendia assassinar Dario e seu filho Justo. Estes, ao saberem do plano, prepararam-se.
Numa visita ao castelo de Takatsuki, onde vivia a família Takayama, na noite de 12/04/1573, Korenaga atacou os Takayama com mais 15 guerreiros. O castelo foi destruído, mas Korenaga saiu ferido e morreu poucos dias depois. Ukon também ficou gravemente ferido, mas depois recuperou-se.
Oda Nobunaga transferiu o feudo de Takatsuki para os Takayama. Dario, desejoso de dedicar-se mais à religião e às obras de caridade, encarregou seu filho, Justo, do território. Aí começa formalmente a carreira política do novo bem-aventurado. Ele tinha cerca de 21 anos. 

Localização da Igreja de Takatsuki

Vida política e uma grande decisão

Aqui já se fala do zelo apostólico de Ukon no auxílio às obras da Igreja e na difusão da doutrina cristã. Na supervisão da reconstrução do castelo, mostrou seu talento militar. Na administração do feudo, sua sabedoria e liderança.
Estátua de Takayama Ukon próximo à Igreja de Takatsuki
Araki Murashige, que depois passou a servir Nobunaga, rebelou-se, porém, contra este em 1578. Aqui ocorreu a primeira grande prova da vida de Justo Takayama Ukon.
Sendo samurai, ele deveria permanecer fiel a seu senhor imediato, no caso, Murashige. Justo aconselhou-o a não fazer guerra e entregou seu filho e sua irmã como reféns, em prova de sua sinceridade. Murashige, porém, estava decidido.
Nobunaga, que sabia que Justo era católico, enviou-lhe um sacerdote (Pe. Organtino) como mensageiro, avisando que executaria os missionários e destruiria as igrejas em seu domínio se Justo não entregasse o castelo. De um lado a fé, do outro a obediência de samurai, a honra de seu pai (que não queria que ele entregasse o castelo) e a vida de seus familiares. Justo passou horas difíceis em oração para encontrar uma solução.
Justo, então, raspou a cabeça e apresentou-se sozinho e desarmado ante Nobunaga. Diante deste gesto, Nobunaga perdoou Justo e aumentou seu feudo. Murashige também devolveu os familiares sem causar-lhes dano, após Dario pedir-lhe perdão pelo ocorrido.
Estátua de Oda Nobunaga
Justo, a partir deste momento de crise, passou a ser um novo homem, livre do medo e das ambições.
Os anos seguintes foram luminosos para a difusão da fé na região.

Guerreiro e senhor em serviço

Em 1582, aconteceu o assassinato de Nobunaga, em Kyoto, e Justo aliou-se a Toyotomi Hideyoshi contra o exército de Akechi Mitsuhide, o assassino: esta foi a Batalha de Yamazaki, acontecida em 02/07 do dito ano. Hideyoshi e os seus saíram vitoriosos (e isto iniciou conflitos com outros servos do falecido Oda Nobunaga, particularmente Shibata Katsuie). Enquanto isso, Justo nunca escondeu-lhe sua fé, nunca hesitou em mostrar-lhe que ela vinha em primeiro lugar em sua vida. É mencionado o episódio do funeral de Oda Nobunaga, em que Justo, embora presente, não executou os ritos budistas tradicionais, por ser católico.
No meio das tensões entre Hideyoshi e Katsuie, Justo foi encarregado de um forte na região de Iwasakiyama. Em 1583, em confronto, por conta da invasão de um exército de Katsuie liderado por Sakuma Morimasa, Justo teve que deixar o posto e foi para as proximidades de Tagami, região sob os cuidados de um dos irmãos de Hideyoshi.
Houve, então, a Batalha de Shizugatake (entre Hideyoshi e Katsuie), em maio desse ano. Justo foi ferido e também perdeu vários guerreiros, mas as forças de Hideyoshi saíram vencedoras.
Pintura ilustrando a Batalha de Shizugatake

Vieram ainda muitas campanhas em que Ukon participou junto aos demais homens de Hideyoshi. Junto disso, tornava-se cada vez mais exímio na prática da Cerimônia do Chá, sendo considerado um dos melhores discípulos de Sen no Rikyu (tido como o personagem histórico que mais influenciou esta tradição japonesa). Não deixou, porém, de exercer seu apostolado, sendo grande patrono de obras católicas, como a construção do novo seminário de Azuchi em Osaka.
O daimyô (senhor feudal), o cristão e o esteta harmonizavam-se aqui numa só pessoa e Takatsuki tinha se tornado praticamente um feudo todo cristão.

Mudança de rumo: outra provação

Em 1585, Hideyoshi fez algumas mudanças em seus domínios e Justo foi transferido de Takatsuki para Akashi. A distância de um lugar para outro é pequena e não distante de Osaka. Ambos ficam na província de Hyogo, na região de Kansai.
Após a invasão da região de Shikoku, com mais algumas batalhas, Justo desejava paz e descanso, mas em maio de 1586 Hideyoshi foi instado a intervir em Kyushu, para derrotar o clã Shimazu. Mais uma campanha de muitas batalhas!
No fim do ano, Hideyoshi, que há pouco tinha recebido o título de Kanpaku (algo como regente imperial) foi pessoalmente a Kyushu com o resto de suas tropas. Justo era membro de sua guarda pessoal e acompanhou-o.
Em 1587, Justo já previa uma mudança na sorte da Igreja do Japão e aconselhava prudência a missionários que iam ter com Hideyoshi.
Infelizmente, Hideyoshi mudou sua forma de olhar para os cristãos e tudo indica que a causa desta mudança de rumo recai sobre o Pe. Gaspar Coelho, missionário português, superior e vice-provincial da missão jesuíta no Japão na época. O sacerdote, que era conselheiro de Hideyoshi, adentrava muito nos assuntos políticos e, enfim, cometeu o grande erro de fazer a Hideyoshi promessas que não poderia cumprir.
Hideyoshi enviou, através de um mensageiro, uma ordem a Justo, seu fidelíssimo vassalo em quem agora já não confiava: se quisesse permanecer a serviço dele, o Kanpaku, ele deveria abandonar sua fé cristã. Também havia um questionamento: por quê encorajou tanto o cristianismo entre seus vassalos em Takatsuki? Isto era um ultimato.
A resposta de Justo era: ele obedeceria a seu senhor em tudo que dissesse respeito à sua posição de vassalo, mas não abandonaria sua fé. Quanto à evangelização de seus vassalos, ele considerava isso o maior feito de sua vida.
Era por volta de 25 de julho de 1587. Hideyoshi ordenou a expulsão dos missionários de Kyushu (a ilha mais ao sul do Japão, que inclui as províncias de Fukuoka e Nagasaki, por exemplo). Justo serenamente deu o seu adeus aos seus amigos e deixou Hakozaki (em Fukuoka), onde estavam acampados. Ele agora era um exilado, um sem senhor, sem direitos civis no Japão. Mais do que isso: era agora um homem verdadeiramente livre.
Destituído de seu feudo, Ukon foi para junto de um daimyô cristão, Agostinho Konishi Yukinaga (que futuramente foi executado, após a derrota na Batalha de Sekigahara, tendo se negado a cometer suicídio por ser cristão), em Hyuga, na ilha de Shodo. Neste tempo pensou em abraçar a vida religiosa, mas o famoso Pe. Valignano ajudou-o a entender em que consistia sua vocação.
Estátua de Agostinho Konishi Yukinaga
Hideyoshi ainda ajudou-o, de certa forma, ao confiar Justo aos cuidados de Maeda Toshiie, senhor de Kaga/Kanazawa.
Em 1592, Hideyoshi, pouco depois da morte de seu filho único, retomou a amizade com Ukon, mesmo sem devolver-lhe a posição e as posses. Justo aceitou-o de bom grado, sem ressentimentos. Pode-se entender aqui que passou a morar em Osaka.
Torre principal do Castelo de Osaka, construído por Toyotomi Hideyoshi
Em 1595 e 1596 Ukon dedicou-se muito ao apostolado entre Osaka e Kyoto.
Em 1598 Hideyoshi morreu e Ukon voltou para Kaga. Lá ele pôde exercer livremente seu apostolado por 16 anos.
Castelo de Kanazawa, do clã Maeda, a quem Ukon serviu em seus últimos anos no Japão
Sob Maeda Toshinaga, herdeiro de Toshiie, ele conseguiu recuperar parcialmente a fortuna de sua família. Servia lealmente a seu novo senhor, de quem se tornou um dos principais vassalos e conselheiros, chegando a participar da Batalha de Sekigahara em 1600. Toshinaga era um dos comandantes das forças aliadas de Tokugawa Ieyasu. A vitória de Ieyasu nesta batalha consolidou o seu poder e deu início ao seu governo como shogun.
Pintura ilustrando a Batalha de Sekigahara
Depois disso ainda viveu tempos de sereno progresso espiritual, onde era notado pelos momentos de oração longa e silenciosa.
Em 1608, perdeu a mãe e o filho mais velho. Enfrentou isto com serenidade.

As últimas provações e a ida para o Céu

Em 1614, Tokugawa Ieyasu publicou seu edito de banimento do cristianismo e de expulsão dos missionários e samurais que não renunciassem sua fé. Ukon pacificamente aceitou e teve de deixar o Japão, dando o definitivo adeus aos seu país de origem. Assim, ele não negou sua fé diante dos três grande poderosos generais do Japão: Nobunaga, Hideyoshi e Ieyasu.
Seu novo senhor, Maeda Toshitsune, irmão de Toshinaga, temeu que Ukon pensasse em resistir com as armas. Conta-se que Justo enviou-lhe uma mensagem dizendo: "Eu não luto por minha salvação com armas, mas com paciência e humildade, de acordo com a doutrina de Jesus Cristo, que professo".
O caminho para o exílio ainda foi duro, contando com a travessia de geladas montanhas. Ele o percorreu com a esposa, a filha e cinco netos.
Em Nagasaki passou ainda alguns meses, em que fez um retiro sob a direção do Pe. Pedro Morejon.
Takayama Ukon, em pintura na Catedral de Osaka

Outra pintura de Takayama Ukon na Catedral de Osaka
Em 8 de novembro de 1614 partiu do porto de Fukuda com os missionários expulsos. O destino era Manila, aonde chegaram no dia 21 de dezembro.
No exílio foi muito bem acolhido e respeitado. Dedicou-se, normalmente, ao progresso interior e às obras de apostolado.
Cerca de 40 dias após a chegada, caiu gravemente enfermo. Já no leito de morte exortou seus descendentes a que guardassem a fé. Morreu no Senhor no dia 3 ou 5 de fevereiro de 1615.
Estátua de Takayama Ukon no Japão similar à das Filipinas (ver abaixo)
O mesmo Pe. Pedro Morejon parece ter sido um dos principais personagens nas primeiras intenções de abrir a causa da canonização de Justo Takayama Ukon, o conhecido "Ukon-dono" ou "Dom Justo" dos missionários. O fechamento do Japão, porém, impossibilitava a procura de materiais e a causa parou no tempo.
Mais de 300 anos depois, em 1940, o Arcebispo de Manila delegou ao Arcebispo de Osaka a autoridade para iniciar a causa de Ukon.
Em 1994 Ukon recebeu o título de "Servo de Deus". A causa de Ukon como "confessor" [da fé] poderia vir a demorar para levá-lo à beatificação. A causa então focou-se em sua doença e morte no exílio, o que lhe valeriam o glorioso nome de mártir e, assim, a causa foi mudada.
Em 21/01/2016 o Papa Franciscou publicou o decreto aprovando sua beatificação como mártir. A grande celebração aconteceu, enfim, no dia 07/02/2017, há poucos dias, em Osaka. A Santa Missa foi presidida pelo Cardeal Angelo Amato, Prefeito da Congregação para a Causa dos Santos.

Missa da Beatificação de Justo Takayama Ukon


Logo da Beatificação

A causa e a cerimônia da beatificação de Takayama Ukon contaram com um logotipo criado por uma religiosa japonesa.
Para entendê-lo, conheça-se primeiramente o kamon (brazão de família) de Takayama Ukon:
Kamon da família Takayama. Estes círculos são chamados de estrelas.
 Abaixo o logo da beatificação:
Logo de promoção da beatificação de Justo Takayama Ukon
No logotipo mantém-se as sete estrelas do kamon de Takayama Ukon. Indicam a família de Ukon, que lhe transmitiu a fé, bem como simbolizam os Sete Sacramentos e os sete Dons do Espírito Santo. O contorno verde recorda a esperança na vida eterna.
A cruz é sinal da oferta da vida de Ukon que, seguindo a Cristo, deu-a por ele e pelos outros.
Os três anéis luminosos ao fundo representam a fé que cresce e fortalece o relacionamento com o único e verdadeiro Deus, a Santíssima Trindade, e com os outros.
Estátua de Takayama Ukon na Plaza Dilao, em Manila, Filipinas



Fontes:
https://takayamaukon.com/fate-of-a-christian-daimyo/
https://wiki.samurai-archives.com/index.php?title=Takayama_Ukon
https://pt.wikipedia.org/wiki/Batalha_de_Yamazaki
https://en.wikipedia.org/wiki/Dom_Justo_Takayama
https://en.wikipedia.org/wiki/Battle_of_Shizugatake
https://en.wikipedia.org/wiki/Battle_of_Sekigahara
https://en.wikipedia.org/wiki/Toyotomi_Hideyoshi
https://www.cbcj.catholic.jp/wp-content/uploads/2017/01/20170207mass.pdf
https://www.cbcj.catholic.jp/wp-content/uploads/2016/05/141127rev.pdf
http://www.catholic-takatsuki.jp/
https://pt.wikipedia.org/wiki/Campanha_de_Ky%C5%ABsh%C5%AB
https://en.wikipedia.org/wiki/Gaspar_Coelho
http://www.pddm.org/index.php/en/news/item/1174-logo-per-la-beatificazione-di-giusto-takayama-ukon

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